terça-feira, 22 de novembro de 2011

Desaparecidxs

Vamos tentar ser humanxs hoje. For a change.

Meu companheiro foi embora hoje. É, ele é um daqueles homens com coisas entre as pernas e que se pensam homens. Estou explicando - e ele está entendendo - que as coisas não são tão preto-no-branco, que ele não é tão homem quanto pensa, e que não ser homem é ótimo! E que se ele se acha heterossexual, bem, temos um problema: se eu não sou mulher, ele não é tão hetero assim...

Deixou já um incômodo, ele ter ido embora. Não é bem saudade-carrapato-melacueca, mas uma coisa muito simples, muito direta: é bom estar lado a lado com um militante tantas horas seguidas!!! Acordar do lado de uma pessoa para quem você não tem que explicar tudo-de-novo, do zero, todos os dias... que não acha um absurdo que eu fale, com todas as letrinhas, que o mundo humano gira em torno de grandes caralhos dourados e voadores, e nós, não homens, somos os alvos desses mísseis de porra. (Adorei essa história de mísseis de porra, gente, que máximo!). Não só isso, mas uma pessoa que aprende. Aprende todos os dias um pouco mais, cheio de dúvidas, dificuldades, mas cheio de vontade de passar por cima disso tudo. Aham, demora pra entender. Nunca estive nesse lugar de fala, mas quando se é branco, com pênis, heterossexual, deve ser difícil entender um bocado de coisas. Mas até agora tudo vale a pena, tudo.

Não posso falar pelas duas pessoas desse blog, e como não tem essa de quem-é-quem... enfim, tenho entrado de cabeça no feminismo. Escrito muito coisas que não sei bem onde enfiar, o que fazer com elas... resolvi sair do armário e entrar no meu lugar de fala. Isso aí. Fiz uma opção política, acadêmica, e um projeto de vida que eu deveria ter feito muitos anos atrás: ver o mundo através da minha opressão. Largar dessa porra de tentar ver pelos olhos dos outros, da teoria dos outros, da opressão dos outros. Cansei. Não vou dizer aqui que meu lugar de fala é a coisa mais constante do mundo. Posso largar tudo e virar freira. Em 10 minutos. Ordem das carmelitas descalças. Não garanto muita coisa do meu futuro, mas garanto que, a partir da minha escolha, ficou tudo bastante claro. Agora uso a teoria que convém para os fins políticos que escolhi: e jogo fora o que não presta, o que não me interessa. Sou feminista, até onde sei, e isso me deixa muito feliz.

Só que me deixa muito solitária. E ser feminista é lidar com coisas muito sérias. O mundo é hostil e não foi feito para nós não-homens. Esse Homem, por sua vez, é uma fatia muito fina do bolo da humanidade: os brancos, heterossexuais, de direita, enfim... Vejam bem, era para ser o contrário! Se o homem, essa coisa aí que eu acho bom de ser combatida, é a menor fatia, eu deveria estar feliz! O resto do bolo inteirinho me pertence... né? E nós somos a maioria, então é só a gente se juntar, colocar ordem na casa e viver feliz para sempre, num paraíso vegan-queer... né?

Não é... é tanta coisa pra explicar, pra desconstruir... Ouvir diariamente que "vocês mulheres/negrxs/minorias-em-geral já têm tudo, o que MAIS vocês querem?"... Ou, pior ainda, falar com as mulheres (elas não têm culpa, eu sei) que dizem "mas eu GOSTO de me sentir bonita, ninguém está me obrigando"... Mostrar diariamente para as pessoas, como uma mãe a uma criança, que a arquitetura, que a tecnologia, que toda a produção humana tem um discurso simples: "Pertence ao caralho". O caralho dourado, voador, grandão, viril, branco, europeu/estadunidense e assim por diante.

Pura coincidência que 10 mulheres morram por dia assassinadas por seus maridos, que 2 sejam agredidas por minuto, que o Brasil seja responsável por quase 50% das mortes de transsexuais no mundo... E é como eu sempre digo, o mais difícil é explicar as coisas fáceis. Essas é que dão trabalho. Essas é que dão uma puta canseira, e eu estou cansada, triste, desgastada, tudo-ao-mesmo-tempo-agora.

Tenho uns planos delinquentes, delirantes, de que as coisas que ando escrevendo aqui no conforto ronronante do meu PC ajudem pessoas a não sofrerem tanto por causa dessa merda de falocentrismo. Elas virão à tona, tudo em tempo; mas por enquanto, estou aproveitando as férias que me dei do querido-blog. Quem milita conhece o desgaste, espero estar perdoadx no coração dos escassos leitores.

Não sei quando volto, mas espero voltar. Enquanto isso, boa noite a todxs!

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